03 jan Das coisas que aprendi enquanto a certeza não vêm
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Cuidado: tem spoiler!!
Não sei se foi coincidência proposital a obra de George Orwell e Mulher Maravilha 1984 se passarem no mesmo ano.Só sei que amei.No filme estrelado pela sucessora de Linda Carter( que aparece graciosamente no final) , um empresário ganancioso tenta roubar uma pedra milenar criada pelos deuses para obter dominação mundial.A frase que ele diz na tv
” Life is good, but it can be better” faz uma clara alusão à indústria da motivação e coaching que tomou rumos desenfreados na atualidade. Concedendo os mais profundos desejos das pessoas e ,em troca, aumentando seu poder pessoal, a pedra faz até a heroína exercitar seu desapego.
Orwell preveu o mundo atual, altamente conectado com as redes sociais e o Estado vigiando tudo.A cena em que ele usa o satélite para falar com o mundo todo, é uma alusão à dominação das redes hoje.
O filme , lançado em meio à pandemia, não poderia prever que teria relações com o momento atual.
No final, todos renunciam ao seu desejo para salvar o mundo. Em tempos de Covid, nada mais coletivo e empático do que renunciar algo para um bem maior.
Renunciamos reuniões, jantares, viagens.Renunciamos beijos, abraços, encontros.
Jorge Forbes escreveu um livro intitulado questionava ” Você quer aquilo que deseja?”, partin do de uma perspectiva de Lacan.Em um mundo globalizado, somos bombardeados a querer sempre mais e mais.Consumimos, enjoamos, voltamos a consumir.Penso que desejos são infantis enquanto aquilo que se realmente quer é algo maduro, consciente.
No filme também pode se ver a questão de vilões não-terapeutizados, com mágoas e frustrações não trabalhados e que depositam em uma pedra a esperança de conquistarem algo sem labuta própria, gerando uma espécie de idolatria pelo poder.
Vejo no dia a dia pessoas assim.Sem trabalharem seus medos e neuroses num divã,estes são depositados em fama, cargos, posições e pasmem , até bolsas importadas, virando uma máscara.E como esta sempre cai, estes indivíduos se atropelam neles próprios, esbarrando em si mesmos.
Só vão para a terapia em último caso, quando os pensamentos e sentimentos estão na UTI.
Enquanto a certeza não vem aprendi que prefiro meu divã à bombardear minhas neuroses.
Divã não sai de moda e lhe confere o verdadeiro poder, o do domínio pessoal.
Pochete não combina comigo.
Nem ombreiras.Nem mangas morcego.Nem sombra azul.Nem calça clochard.Mas isso tudo , deixemos em 1984.
25/12/2020
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